quarta-feira, agosto 20, 2008

MADRIGAL GENÉRICO

MADRIGAL GENÉRICO


Não é que eu queira
discutir Nietzsche,
analisar
Marília Pêra
ou Afrodite.
Sei que desbanca
minha retórica
ao declamar
Florbela Espanca
no edredom
ou ao citar
Carlos Drummond
em devaneios.
Mas, ouça bem:
não me interessam
os seus enleios,
se você lê
o que não leio,
se você sabe
os descaminhos.

Pois você veio
de mansinho
descortinando
os próprios olhos
e agora eu —
fútil ­e burro —
sei que já ando
vazio, rindo
dentro do breu,
donde sussurro:
“Lindo... és lindo...
e serás meu”.

segunda-feira, agosto 18, 2008

Haicai III

Diagnosticado:
o dia agora
em nós foi esticado.

sexta-feira, agosto 15, 2008

ENGANA-SE

ENGANA-SE



não pense não
que sou dengoso
não pise não
que sou lodoso
fique de fora
sou infernal
meu coro cora
meu toque é mau
meu sonho são
meu tempo não
não peça não
consolação
não force não
que estou lacrado
não chore não
que sou safado
e me aproveito
e desacato
e rarefeito
mesmo mato
não tente não
que todos sabem
que dou a mão
de sacanagem
não queira não
que sou famoso
pra solidão
sou talentoso

quarta-feira, agosto 13, 2008

OS TERÇOS FATÍDICOS DE BAUCI

OS TERÇOS FATÍDICOS DE BAUCI



I.
Ela despreza o chão.
Odeia sentir-se presa a qualquer coisa.
Quer ser como um pássaro
a enganar a gravidade.
Mas ela não tem asas.

Não quer prender-se a nada.
Ela está presa à solidão.


II.
Ela respeita o que não é
e teme o poder de seu próprio toque.
Admira a evolução natural das coisas.

Celebra atentamente as modificações do mundo
e não se dá conta do que nela muda.


III.
Ela idolatra tudo em que não está contida.
Ama sua ausência,
sua não-interferência.
Ela não se ama.

Tudo o que não faz parte de si, ela quer.
Ela não quer nada.

quarta-feira, agosto 06, 2008

UMOLHAR

UMOLHAR
para Wanessa



sou um beberrão
quando você ressaca
num sopro qualquer
e a terra embriaga-se
às gotas divinas
de um mar mulher


tu és a água na lua
que evapora e brota eterna
e sempre que flutuas nua
o mar recolhe-se entrepernas

segunda-feira, agosto 04, 2008

FALTA FALTA

FALTA FALTA


tantos olhos me roubaram
que não vejo
que não vejo